Barroco: características, contexto histórico, autores e obras relevantes

Louise Oliveira
Louise Oliveira
Professora de Português
Atualizado em

O Barroco é um movimento cultural e artístico ocorrido entre o final do século XVI e o século XVIII. Sua origem foi em Roma, na Itália, estendendo-se por outros países europeus e algumas colônias.

Nesse período, o homem vivia um grande conflito: de um lado, a convivência com os valores renascentistas; de outro, o resgate de valores religiosos e a busca pela salvação.

A literatura e as outras artes traduziam as contradições dessa tensão. Por isso, as principais características do Barroco são o conflito entre fé e razão, a consciência da transitoriedade do tempo e uma visão trágica da vida.

Características do Barroco

Na linguagem do Barroco dois estilos se destacam: o cultismo e o conceptismo.

Gôngora à esquerda e Quevedo à direita. No traje de Quevedo há uma representação da Ordem de Santiago.
Representação de Gôngora (à esquerda) e Quevedo (à direita), escritores barrocos espanhóis que influenciaram o cultismo e o conceptismo.

Cultismo ou gongorismo

O foco do cultismo é a elaboração de uma linguagem rebuscada. Para atingir esse objetivo, os autores usam:

  • variadas figuras de linguagem (metáfora, metonímia, antítese, paradoxo, hipérbole, hipérbato etc.);
  • jogos de palavras (trocadilhos, relação entre sinônimos, relação entre antônimos, semelhança de palavras com diferentes significados, perífrases);
  • linguagem culta, formal, extravagante;
  • frases muito elaboradas.

Conceptismo ou quevedismo

O foco do conceptismo é o trabalho com as ideias e os conceitos, seguindo um raciocínio lógico e valorizando a construção intelectual dos textos. Para atingir esse objetivo, os autores usam:

  • estratégias argumentativas para convencer os leitores ou ouvintes, com citações, exemplos, analogias, comparações;
  • relações de causa, consequência e condição para construir os argumentos;
  • repetição de ideias e de palavras para reforçar um conceito;
  • figuras de linguagem (metáfora, analogia, comparação, antítese etc.).

Conheça mais as figuras de linguagem.

O cultismo é mais comum na poesia e o conceptismo na prosa, mas os dois estilos podem ser usados no mesmo texto.

Temas do Barroco

Outras características estão relacionadas aos temas explorados no Barroco. Veja quais são.

  • Culto do contraste (vida e morte, sagrado e profano, luzes e sombras, racional e irracional etc.)
  • Consciência da transitoriedade da vida e do tempo
  • Concepção trágica da vida
  • Conflito entre fé e razão
  • Sensualismo e sentimento de culpa
  • Carpe diem (aproveita o dia), geralmente revestido pelo conflito
  • Fusionismo (fusão das visões medieval e renascentista)
  • Pessimismo e Feísmo (exploração da miséria da condição humana)
  • Dinamismo (criar sensação de movimento, representando o período instável)

Contexto histórico

Entre os séculos XV e XVI, muitos intelectuais da época buscavam respostas racionais para as suas perguntas, baseadas na razão e não na religião.

O Renascimento desenvolveu-se nesse contexto. Houve uma renovação no tratamento de várias questões e o aumento da produção cultural, impulsionado pela imprensa.

Reforma Protestante

O sentimento nacionalista cresceu. Além disso, aumentaram as críticas a doutrinas da Igreja Católica e a determinadas práticas do clero, desencadeando o movimento de reforma religiosa conhecido como Reforma Protestante.

Esse movimento rompeu a unidade do cristianismo (católico) no Ocidente, levando ao surgimento de diversas igrejas independentes.

Reforma Católica (Contrarreforma)

Como a Igreja Católica perdia cada vez mais o seu poder e influência, ela acelerou a tomada de providências para tentar impedir o avanço das ideias protestantes, em um movimento conhecido como Contrarreforma ou Reforma Católica.

Dentre as medidas tomadas pela instituição estão a fundação da Ordem dos Jesuítas (1534), a realização do Concílio de Trento (1545 a 1563) e a volta da Inquisição (incluindo uma lista de livros proibidos aos católicos).

É nesse cenário turbulento que se encontra o homem do Barroco: dividido entre a fé e a razão, lutando internamente com questões existenciais, em um tempo de perseguições da Igreja Católica e sua luta pelo poder.

Uma das táticas adotadas pela Igreja Católica para manter sua influência foi o uso e o patrocínio da arte. Assim, a instituição religiosa influenciou fortemente o Barroco, moldando as suas características.

Pintura representando o momento em que os três reis, acompanhados por uma grande procissão, apresentam os seus presentes ao menino Jesus. Este, nos braços da mãe, parece brincar com o incenso que Gaspar lhe apresenta, ajoelhado diante dele. A cena está localizada no exterior e se passa à noite. Porém a luminosidade é nítida, e o menino Jesus irradia a luz que incide sobre os demais personagens.
Rubens, Peter Paul. A Adoração dos Magos. 1609. Óleo sobre tela.

Na Europa do Norte, o Barroco teve nuances diferentes, porque o movimento protestante ganhou mais força na região, difundindo-se por ela. Já no sul europeu, o domínio católico prevaleceu nos territórios atuais de Portugal, Espanha e Itália.

Barroco no Brasil

O Barroco no Brasil ocorreu entre os séculos XVII e XVIII. Iniciou-se em 1601 com a obra Prosopopeia, de Bento Teixeira. Na época da colonização, o catolicismo era a religião oficial de Portugal.

Os autores, como Gregório de Matos, Botelho de Oliveira e Frei Itaparica seguiram padrões e inspirações do barroquismo ibérico e italiano.

Barroco na literatura: principais autores e obras

Agora que você conhece as principais características do Barroco, veja os grandes nomes do barroco português.

  • Pe. Antônio Vieira (1608-1697). Principais obras: Sermão de Santo Antônio aos Peixes (1654), Sermão da Sexagésima (1655), Sermão do Bom Ladrão (1655).
  • D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666). Principais obras: Carta de Guia de Casados (1651), Obras Métricas (1665), Apólogos Dialogais (1721).
  • Soror Mariana Alcoforado (1640-1723): Principais obras: Cartas Portuguesas (1669).

Veja também os principais nomes brasileiros desse período:

  • Gregório de Matos (1633-1696).
  • Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711).
  • Frei Manuel da Santa Maria de Itaparica (1704-1768).

Padre Antônio Vieira

Padre Antônio Vieira (1608-1697) nasceu em Lisboa e ainda criança foi morar no Brasil, onde passou a maior parte da sua vida. Considerado o principal escritor do barroco português, sua obra abrange as literaturas portuguesa e brasileira.

Vieira teve sólida formação intelectual e cultural. Não é por acaso que Fernando Pessoa o chamou de Imperador da Língua Portuguesa.

Sendo um brilhante orador, ele se tornou um frequente visitante das cortes portuguesas e também desempenhou papéis em missões diplomáticas em outras cortes europeias.

Membro da Ordem dos Jesuítas, Vieira dedicou-se a causas humanitárias e teve confrontos com colonos e a própria Igreja Católica na defesa de seus ideais. Foi contrário à escravização dos índios e defendeu outras causas, como a dos judeus.

O conceptismo está muito presente nos sermões de Vieira. Veja um trecho do Sermão de Santo Antônio (aos peixes), pregado em 1654 na cidade de São Luís do Maranhão.

Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra: e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal. O efeito do sal é impedir a corrupção, mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção? Ou é porque o sal não salga, ou porque a não se deixa salgar. Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina que lhe dão, a não querer receber. [...] Não é tudo isso verdade? Ainda mal.

Gregório de Matos

Gregório de Matos e Guerra (1633-1696) é considerado o primeiro grande poeta brasileiro. Nascido em Salvador e filho de família abastada, recebeu ampla formação cultural e estudou Direito na Universidade de Coimbra, em Portugal.

Os seus textos contêm influências de poetas barrocos como Quevedo e Gôngora. Mas, além disso, incorporam a vida colonial, abordando temas locais, expressões populares e termos de origem indígena e africana.

Durante a vida do escritor, seus poemas não foram publicados de forma impressa. Na época, era comum serem declamados em voz alta e memorizados. Também poderiam circular em cópias manuscritas (códices).

Sua obra divide-se em dois tipos de poesia: lírica (amorosa, filosófica ou religiosa) e satírica. Em razão de suas sátiras, ficou conhecido como “Boca do Inferno”.

Veja exemplos analisados de poemas.

Poesia lírica

Ofendi-vos, Meu Deus, bem é verdade;
É verdade, meu Deus, que hei delinquido,
Delinquido vos tenho, e ofendido,
Ofendido vos tem minha maldade.

Maldade, que encaminha à vaidade,
Vaidade, que todo me há vencido;
Vencido quero ver-me, e arrependido,
Arrependido a tanta enormidade.

Arrependido estou de coração,
De coração vos busco, dai-me abraços,
Abraços, que me rendem vossa luz.

Luz, que claro me mostra a salvação,
A salvação pretendo em tais abraços,
Misericórdia, Amor, Jesus, Jesus.

Nesse poema, o eu lírico dirige-se a Deus para se confessar. Menciona a maldade com que o ofendeu e demonstra seu desejo de ser vencido por Cristo.

Dentre as figuras de linguagem em destaque, observamos a antítese (entre arrependido e ofendido) e a anadiplose, figura pouco conhecida e que funciona desta forma: uma palavra do final de um verso é repetida no início do próximo verso.

Por exemplo: a palavra verdade finaliza o primeiro verso e começa o segundo. Esse recurso é importante para o realce de ideias, como o sentimento de angústia do eu lírico.

Poesia satírica

A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.


Em cada porta um bem frequente olheiro,
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
Para o levar à praça e ao terreiro.


Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia.


Estupendas usuras nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres:
E eis aqui a cidade da Bahia.

Por sua vez, o poema satírico exemplificado contém uma crítica aos governantes. Nota-se o uso de várias figuras de linguagem, como a metonímia (cabana, vinha e cozinha), ironia (grande conselheiro) e gradação (Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha), que ajudam na expressividade do texto.

O Barroco nas outras artes

Os principais artistas plásticos barrocos na Europa são Caravaggio, Rubens, Rembrandt e Velázquez. Em Portugal, destaca-se a pintora Josefa de Óbidos.

Uma curiosidade sobre a obra de Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610), o grande pintor italiano do Barroco: sua fama deve-se em grande parte ao realismo da sua obra. O tratamento que ele deu às figuras religiosas, por exemplo, tornou-as mais reais, por vezes enrugadas e mal trajadas.

Antes do Barroco, as figuras bíblicas eram retratadas de forma idealizada e bela. Assim, as pessoas da época ficaram impactadas com a obra.

A pintura apresenta Tomé colocando um dedo na ferida do lado de Jesus, com dois outros apóstolos assistindo a cena. Os quatro estão dispostos em um fundo neutro e escuro. Jesus irradia a luz que incide sobre os demais personagens.
Caravaggio. Tomé, o Incrédulo. 1602. Óleo sobre tela.

Existe, ainda, notória produção na arquitetura, na música, no teatro, entre outras expressões. Na música, ganham realce as composições de Vivaldi, Johann Sebastian Bach e Georg Friedrich Haendel.

No Brasil, a arte barroca se destacou na segunda metade do século XVIII, com o ciclo do ouro. Os trabalhos mais importantes são os de Aleijadinho, Manuel da Costa Ataíde e as composições sacras de Lobo de Mesquita e Marcos Coelho.

A arte barroca no Brasil tem forte influência do rococó europeu.

A pintura apresenta quatro anjos tocando diferentes instrumentos musicais. Outros dois anjos aparecem ao fundo.
Mestre Ataíde. Anjos músicos. Igreja de São Francisco, Ouro Preto, MG.

Veja também: Quinhentismo: características, autores e obras relevantes.

Referências

BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 50 ed. São Paulo: Cultrix, 2015.

CEREJA, W. R; MAGALHÃES, T. C. Português: Linguagens. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

Louise Oliveira
Louise Oliveira
Graduada em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é professora de Língua Portuguesa, autora de materiais didáticos e revisora de textos. Apaixonada pela escrita e pelo ensino de língua materna, produz conteúdos educacionais desde 2009 e carrega o propósito de levar educação de qualidade a todos.

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